“Eu quero minha mãe só pra mim”
Mal
Intencionados é um livro forte, perturbador e pode até causar arrepios. Claro
que não pela escrita limpa e objetiva de Geyme Lechner, mas sim pelo tema
proposto. Um filho que é apaixonado
pela mãe, uma mãe que, quando muito nova, “atacara” o homem que amava até tê-lo
sob seu domínio. Um pai que a gente não
sabe se foge porque é vilão e covarde ou se apenas não aguentou mais aquela
situação, abusos, pedofilia, preconceitos extremos...
Chega um
momento no livro, onde a gente pensa que simplesmente não existe pessoas boas
no mundo. Todos são egoístas, luxuriosos, gananciosos, pervertidos e – sim!!! –
mal intencionados.
Tomás, nosso
herói que é mais vilão que vítima. Um personagem assustador à primeira vista,
um anticristo, alguém que tememos tanto e odiamos de tal maneira que nos fazer
esquecer que ele é apenas uma criança. Quando o jogo vira, e ele se torna a
vítima de fato, fiquei em dúvida entre sentir pena ou dizer um alto “bem
feito”. Claro, o sentimento de “vingança” passa rápido e logo a compaixão
aparece. Ninguém merece sofrer o que ele sofre, nenhuma criança, por mais
terrível que ela tenha sido durante a infância.
Ana, nossa
pobre mãe. Parece ser uma mulher tão fraca, tão feliz de ter um aquele filho
com o homem que tanto ama, que tanto batalhou para conseguir. Quando a autora
nos mostra seu passado, essa sua personalidade frágil é completamente
desmascarada. E, céus! Ela era tão jovem! Ainda é.
Antônio, o
pai que nos parece tão esforçado em amar aquele filho que apenas o repudia. Passei
a odiá-lo quando ele se foi, deixando Ana com o fardo de criar Tomás, e por
tudo que acontece aos dois depois de sua partida... Mas, se eu estivesse no
lugar dele, também teria ido embora, para falar a verdade.
Esses são os
primeiros personagens que nos são mostrados no livro, temo contar muito spoiler
se falar de outros como Agnes, como as Marias, como *arrepios e ânsia de
vômitos* Damião.
A escrita é,
como falei, limpa, sem enfeites. O que tem que ser escrito, está ali, sem pudor
algum, para nos mostrar quão real e cruel e sujo o mundo e as pessoas podem
ser. A autora em nenhum momento quis embelezar a história com eufemismos e
promessas de final feliz. O interessante foi ler tudo aquilo que a gente chega
a ignorar no nosso dia-a-dia. A fome, a miséria, os vícios, os crimes, as
perversidades. A gente se tranca no nosso mundinho encantado e esquece que o
mundo não é daquele jeito para todos. Ótimo trabalho o da autora de nos dar
esse tapa de realidade. Uma autora corajosa, ousada e que conseguiu cumprir com
a promessa do livro que era de: todas as
máscaras caem. Você iria tão baixo por algo que deseja? Quem quer sujar as
mãos?
Em todo livro
há aquela pequena coisinha que incomoda, que tranca a leitura, que nos faz
querer desistir de continuar lendo... Em Mal Intencionados teve, é claro. E, na
minha opinião, foi a parte sobre a Igreja Evangélica. Aquela parte do livro não
parecia terminar nunca e, para falar a verdade, não vi nem razão – além de um
preconceito da autora para com a religião – para ter no livro. Na verdade, toda
vez que a autora citava religiões, havia um certo preconceito, como se todas
elas fossem ruins ou quem tem fé é apenas um ovelha no meio de um rebanho do
pastor. Certo, há corrupção, há roubalheira, há gente falsa brincando com a fé
das pessoas, sim, há sim! Mas essas pessoas não têm culpa. Não podem ser
tachadas como burras e ignorantes. Claro que a autora jamais usou essas
palavras, mas estava ali – Quem é evangélico é cruel e ignorante. É o que está
no livro. Quem é católico é pedófilo! Não sou religiosa, não sigo nenhuma religião,
seita, grupo, nada, nada e fiquei ofendida! Imagina quem for católico,
evangélico ou de qualquer outra religião? Pessoas que não seguirão com a
leitura como eu segui. Pessoas que queimarão ao livro ofendidas. É difícil,
sim, falar de assuntos polêmicos, e não sei dizer se a autora conseguiu ser
imparcial enquanto o fazia. Uma pena, o livro seria muito melhor sem essa
parte. Claro, também, que é apenas minha opinião.
Ignorando a
parte da religião, Mal Intencionados é um livro denso, com um quê de Rubem
Fonseca, onde você não sabe até o final para quem torcer, onde todos são
vilões.
E, falando em
final, acredito que foi o final perfeito. Ninguém mudou. O mundo continua sempre
igual. Ninguém se arrepende e, no fim, todos somos um pouco Mal Intencionados.
Resenha por Marcia Luisa Bastilho